Um trabalho encenado por Pedro Wilson. Quando temos esta informação é natural que nos questionemos: então para além das referências explícitas ao sexo (sexo oral, cenas de Sado-masoquismo, chicotes figurinos de cabedal, cintos de ligas e até mesmo sexo convencional) o que é que Pedro Wilson nos traz de novo? Às vezes temos a sorte de ver uma encenação com algo mais que isto, ou mesmo, pasme-se, sem qualquer referência ao universo do sexo. Desta vez, tanto o grupo “A Gaveta” como o espectador, não teve direito a nada mais que isto. Eugene Ionesco, nascido na Roménia começou a escrever os seus textos a partir dos livros de lições de Inglês, como se pode ver no seu texto A Cantora Careca. Com essa peça Ionesco inspirou uma revolução importante nas técnicas dramáticas e inaugurou o "teatro do absurdo" ou o "anti-teatro". Esse teatro era realmente um teatro "puro", despojado de convenções, cruelmente poético, arbitrário e imaginativo. Ionesco, influenciado por Kafka e Jarry, caricaturou o real e o "absurdo", exteriorizou fantasias secretas, geralmente obtendo uma relevância social profunda. Para ele, não era só uma determinada sociedade que lhe parecia ridícula mas a própria humanidade. O teatro do absurdo surgiu assim para dar um imenso murro no estômago de uma sociedade bem pensante e decadente. Em resumo, Ionesco rejeitava a estrutura lógica, o desenvolvimento das personagens e o pensamento do teatro tradicional, tendo criado sua forma própria de comédia anárquica para expressar a existência sem sentido do homem moderno num universo governado pelo acaso. Era uma maneira acessível de nos obrigar a ver o mundo de um outro ponto de vista, como se de repente, alguém vestisse o casaco do avesso para que passassem a olhar para ele de uma outra maneira. Para que alguém reparasse, de facto, nele.
O que aconteceu com o trabalho encenado por Wilson e apresentado pela “Gaveta” é que o texto, divertido e absurdo, deixou de ser divertido porque passou a ser vulgar. Uma lição em que um professor de meia idade dá explicações particulares a uma aluna com figurino de colegial ingénua não precisa de mais nada para estimular a imaginação. E é isso que Wilson faz frequentemente: tira-nos a imaginação e a possibilidade de construir para além do sugerido, tornando a leitura óbvia e destruindo a beleza simbólica do teatro. Essa capacidade de reconhecimento total a partir de um fragmento. O grupo de actores, composto por João Bota, Tânia Sofia e Ana Paula Santos, teve um bom desempenho tendo em conta o que lhes foi pedido. Eram convincentes apesar de patéticos. Quando o professor entra no seu escritório e começa de uma forma óbvia a perseguir a aluna com vista a uma ligação erótica, destruiu todo o texto de Ionesco. Ionesco não criou o grotesco nas suas obras. Criou textos muito bem articulados de forma a apresentar-nos, através do poder da metáfora, a incongruência da humanidade. Se Ionesco quisesse escrever uma peça pornográfica certamente tê-la-ia escrito numa altura em que os simbolistas afirmaram um outro conceito de teatro, o anti-teatro, numa altura em que o mundo estava em ebulição. Então porque não o fez? Provavelmente porque sabia que estaria a ser mais eficaz com um texto absurdo do que com um texto pornográfico. O que aconteceu no Instituto Português da Juventude, em Faro, foi uma gargalhada geral nervosa quando a aluna sugeria estar a fazer sexo oral ao professor, quando o professor deslizava por cima da aluna, ou outras composições bem mais explícitas. E com isto perdeu-se o texto de Ionesco. Com esta necessidade absurda da corporalidade perdeu-se a subtileza do absurdo e a força do símbolo que nos entrega a mensagem do autor como ele quer. Senão, teria escrito um texto óbvio. O desenho de luz não existia e se aquilo era uma sátira à educação... com certeza que os alunos do sexto ano que assistiam naquela noite àquele espectáculo não o entenderam assim uma vez que apenas riam nas alusões sexuais. O suporte musical com a ideia de tempo podia dar a noção de tensão mas foi muito pouco para um texto de onde se podia ter retirado tanto. O público quer mais do que um teatro que o direccione a pensar desta ou daquela maneira. O público quer que o respeitem. Seja o público algarvio, seja outro qualquer. O mesmo acontece com os grupos não profissionais. Estes grupos, que contribuem para a afirmação da cultura das suas terras merecem ser tratados com o respeito que o seu trabalho merece. E é tão fácil pôr o público a rir com piadas de mau gosto e alusões grosseiras. Talvez tenha tido sentido nos anos 80, mas agora falar-se de sexo e fazerem-se encenações em que o sexo se exponha de forma óbvia, não é ousadia, é banal. Pedro Wilson é um encenador que já fez trabalhos que nos mostram um pouco mais que as suas idiossincrasias e os seus problemas pessoais. Sabemos que quando quer é um bom encenador. Então por que é que se dá ao luxo de vir para o Algarve e para os grupos não profissionais fazer encenações menores? O Algarve, felizmente, vai tendo homens e mulheres que sabem ir ao fundo de um texto e de um autor e trazê-lo ao público de uma forma adequada. E os algarvios já não recebem com um olhar ingénuo tudo o que se lhes apresenta. Ficamos à espera do próximo trabalho do grupo de Portimão, desta vez com um programa de sala a acompanhar, como fazem os grupos que verdadeiramente consideram que o teatro também serve para educar o público.
O que aconteceu com o trabalho encenado por Wilson e apresentado pela “Gaveta” é que o texto, divertido e absurdo, deixou de ser divertido porque passou a ser vulgar. Uma lição em que um professor de meia idade dá explicações particulares a uma aluna com figurino de colegial ingénua não precisa de mais nada para estimular a imaginação. E é isso que Wilson faz frequentemente: tira-nos a imaginação e a possibilidade de construir para além do sugerido, tornando a leitura óbvia e destruindo a beleza simbólica do teatro. Essa capacidade de reconhecimento total a partir de um fragmento. O grupo de actores, composto por João Bota, Tânia Sofia e Ana Paula Santos, teve um bom desempenho tendo em conta o que lhes foi pedido. Eram convincentes apesar de patéticos. Quando o professor entra no seu escritório e começa de uma forma óbvia a perseguir a aluna com vista a uma ligação erótica, destruiu todo o texto de Ionesco. Ionesco não criou o grotesco nas suas obras. Criou textos muito bem articulados de forma a apresentar-nos, através do poder da metáfora, a incongruência da humanidade. Se Ionesco quisesse escrever uma peça pornográfica certamente tê-la-ia escrito numa altura em que os simbolistas afirmaram um outro conceito de teatro, o anti-teatro, numa altura em que o mundo estava em ebulição. Então porque não o fez? Provavelmente porque sabia que estaria a ser mais eficaz com um texto absurdo do que com um texto pornográfico. O que aconteceu no Instituto Português da Juventude, em Faro, foi uma gargalhada geral nervosa quando a aluna sugeria estar a fazer sexo oral ao professor, quando o professor deslizava por cima da aluna, ou outras composições bem mais explícitas. E com isto perdeu-se o texto de Ionesco. Com esta necessidade absurda da corporalidade perdeu-se a subtileza do absurdo e a força do símbolo que nos entrega a mensagem do autor como ele quer. Senão, teria escrito um texto óbvio. O desenho de luz não existia e se aquilo era uma sátira à educação... com certeza que os alunos do sexto ano que assistiam naquela noite àquele espectáculo não o entenderam assim uma vez que apenas riam nas alusões sexuais. O suporte musical com a ideia de tempo podia dar a noção de tensão mas foi muito pouco para um texto de onde se podia ter retirado tanto. O público quer mais do que um teatro que o direccione a pensar desta ou daquela maneira. O público quer que o respeitem. Seja o público algarvio, seja outro qualquer. O mesmo acontece com os grupos não profissionais. Estes grupos, que contribuem para a afirmação da cultura das suas terras merecem ser tratados com o respeito que o seu trabalho merece. E é tão fácil pôr o público a rir com piadas de mau gosto e alusões grosseiras. Talvez tenha tido sentido nos anos 80, mas agora falar-se de sexo e fazerem-se encenações em que o sexo se exponha de forma óbvia, não é ousadia, é banal. Pedro Wilson é um encenador que já fez trabalhos que nos mostram um pouco mais que as suas idiossincrasias e os seus problemas pessoais. Sabemos que quando quer é um bom encenador. Então por que é que se dá ao luxo de vir para o Algarve e para os grupos não profissionais fazer encenações menores? O Algarve, felizmente, vai tendo homens e mulheres que sabem ir ao fundo de um texto e de um autor e trazê-lo ao público de uma forma adequada. E os algarvios já não recebem com um olhar ingénuo tudo o que se lhes apresenta. Ficamos à espera do próximo trabalho do grupo de Portimão, desta vez com um programa de sala a acompanhar, como fazem os grupos que verdadeiramente consideram que o teatro também serve para educar o público.
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