Uma vez mais, no Centro Cultural de Lagos, Duval Pestana impôs o seu estilo como encenador. Inserido no Grupo Infanto-Juvenil de Expressão Dramática da Associação do Grupo Coral de Lagos, que fundou, trouxe-nos o espectáculo Visitar Tardieu na Primavera, composto por três pequenos textos de Jean Tardieu. Pouco conhecido no universo teatral português, Tardieu foi um escritor francês, tradutor de Goethe e Hölderlin, galardoado com o prémio Société des Gens de Lettres en 1986. Dizem as crónicas que aos 17 anos, após uma infância feliz, caiu numa depressão profunda, que ele classificou de metafísica e que o iria acompanhar para o resto da vida, definindo-lhe o ponto de vista acerca do mundo e do real.
Tardieu, nestas três pequenas peças fala-nos da tragédia da linguagem. E a propósito desta tragédia, em que as palavras são utilizadas arbitrariamente com outros sentidos muito distintos do seu significado, critica o ser humano que paira alegre e distraidamente por um universo de significantes.
A primeira peça, A Menina e o Altifalante, interpretada pela pequena Ana Carolina Martins é uma provocação às análises feitas pelos videntes, caricaturados como psicanalistas do futuro. Neste texto, extremamente irónico, Tardieu brinca com as análises feitas por especialistas em horóscopos que dão ao paciente desesperado a ilusão de uma felicidade imediata. A pequena actriz defendeu o texto com uma maturidade surpreendente. Com uma cenografia simples, depurada, Ana Carolina aguentou o texto com a verdade ajustada. No final, parte ansiando por um encontro marcado pelo horóscopo zodiacal e com uma falsa ilusão de felicidade.
A segunda peça, Un Mot Pour Um Autre, interpretada por cinco actores, João Diogo Pratas, Inês Lopes, Carolina Santos, Ariana Bárbara e Diana Pop, funcionou como uma chamada de atenção para a complexidade da linguagem os actores discorriam com segurança por um texto onde os substantivos e os adjectivos eram retirados do seu conteúdo semântico, sendo substituídos por outros de significado completamente diferente.O curioso é que o texto mantinha o seu sentido, sustentado pela estrutura gramatical. Os actores, sustentados por figurinos glamourosos do princípio do séc. XX defenderam com dignidade o texto assentado a sua actuação mais no decorar do difícil texto que propriamente da interpretação.
A terceira peça, O Guichet, interpretado por Rita Pereira, Pedro Ribeiro, Margarida Duarte e Ana Carolina Martins, foi um trabalho onde já se viu um apontamento de teatro muito bem conseguido. Numa linha onde impera o humor negro, Rita pereira e Pedro Ribeiro conseguem manter um registo notável de profissionalismo e rigor notáveis. Os objectos imaginários são assumidos do princípio ao fim sem enganos nem hesitações. As palavras são ditas com uma dicção correcta e com a emoção correcta para aquele tipo de texto. Um acerto apenas na pronúncia acentuada do Barlavento e o texto soaria perfeito. Um texto fleumático em que uma morte anunciada é dita com a mesma frieza com que se dá uma informação sobre um horário de metro. Um texto que infelizmente nos traz inúmeras familiaridades quando necessitamos de recorrer a serviços de atendimento ao público. Tiramos uma senha, esperamos, respondemos a inúmeras perguntas anódinas para a nossa inquietação e somos quase sempre tratados como um número isento de sentimentos. As soluções de encenação também são interessantes. Com a menina do guichet entrando no seu local de trabalho com passos de uma bailarina sonhada e no fim a colocar a palavra EXIT na ordem de que tinha sido retirada.
As mudanças de cena são efectuadas quase em black-out com a segurança de quem conhece muito bem o espaço do espectáculo, sem enganos nem atropelos.
O folheto, conciso, fornece ao espectador a informação mínima, ponto de partida para uma ulterior pesquisa. Um texto sucinto mas profundo de Duval Pestana integra o espectador menos atento no universo do absurdo. Na ficha técnica falta a distribuição dos papéis pelas personagens. De qualquer forma, é um instrumento de trabalho que dá lições a grupos universitários que, apesar de terem como obrigação inerente ao seu estatuto a formação de públicos, muitas vezes nem constroem uma folha de sala com contributos para a leitura do espectáculo.
Movimentando-se no universo do Teatro do Absurdo com o à vontade que quem conhece profundamente os autores e os textos, Duval Pestana presta ano após ano um verdadeiro serviço público no que diz respeito à educação do público para o teatro. Lagos tem o privilégio de contar entre os seus pares com este notável encenador que trabalha por dentro, a partir dos jovens, a aprendizagem para a apreciação de um espectáculo teatral. É pois natural que vejamos cada vez mais o teatro reaparecer naquela cidade barlaventina, nas suas formas mais variadas, apoiando os grupos regionais, apreciando as propostas nacionais. Com uma infra-estrutura de excelência, com professores a trabalharem na educação de públicos, cabe à vontade política investir ao longo do ano na mais completa de todas as artes, suporte da educação de um povo: o teatro.
Tardieu, nestas três pequenas peças fala-nos da tragédia da linguagem. E a propósito desta tragédia, em que as palavras são utilizadas arbitrariamente com outros sentidos muito distintos do seu significado, critica o ser humano que paira alegre e distraidamente por um universo de significantes.
A primeira peça, A Menina e o Altifalante, interpretada pela pequena Ana Carolina Martins é uma provocação às análises feitas pelos videntes, caricaturados como psicanalistas do futuro. Neste texto, extremamente irónico, Tardieu brinca com as análises feitas por especialistas em horóscopos que dão ao paciente desesperado a ilusão de uma felicidade imediata. A pequena actriz defendeu o texto com uma maturidade surpreendente. Com uma cenografia simples, depurada, Ana Carolina aguentou o texto com a verdade ajustada. No final, parte ansiando por um encontro marcado pelo horóscopo zodiacal e com uma falsa ilusão de felicidade.
A segunda peça, Un Mot Pour Um Autre, interpretada por cinco actores, João Diogo Pratas, Inês Lopes, Carolina Santos, Ariana Bárbara e Diana Pop, funcionou como uma chamada de atenção para a complexidade da linguagem os actores discorriam com segurança por um texto onde os substantivos e os adjectivos eram retirados do seu conteúdo semântico, sendo substituídos por outros de significado completamente diferente.O curioso é que o texto mantinha o seu sentido, sustentado pela estrutura gramatical. Os actores, sustentados por figurinos glamourosos do princípio do séc. XX defenderam com dignidade o texto assentado a sua actuação mais no decorar do difícil texto que propriamente da interpretação.
A terceira peça, O Guichet, interpretado por Rita Pereira, Pedro Ribeiro, Margarida Duarte e Ana Carolina Martins, foi um trabalho onde já se viu um apontamento de teatro muito bem conseguido. Numa linha onde impera o humor negro, Rita pereira e Pedro Ribeiro conseguem manter um registo notável de profissionalismo e rigor notáveis. Os objectos imaginários são assumidos do princípio ao fim sem enganos nem hesitações. As palavras são ditas com uma dicção correcta e com a emoção correcta para aquele tipo de texto. Um acerto apenas na pronúncia acentuada do Barlavento e o texto soaria perfeito. Um texto fleumático em que uma morte anunciada é dita com a mesma frieza com que se dá uma informação sobre um horário de metro. Um texto que infelizmente nos traz inúmeras familiaridades quando necessitamos de recorrer a serviços de atendimento ao público. Tiramos uma senha, esperamos, respondemos a inúmeras perguntas anódinas para a nossa inquietação e somos quase sempre tratados como um número isento de sentimentos. As soluções de encenação também são interessantes. Com a menina do guichet entrando no seu local de trabalho com passos de uma bailarina sonhada e no fim a colocar a palavra EXIT na ordem de que tinha sido retirada.
As mudanças de cena são efectuadas quase em black-out com a segurança de quem conhece muito bem o espaço do espectáculo, sem enganos nem atropelos.
O folheto, conciso, fornece ao espectador a informação mínima, ponto de partida para uma ulterior pesquisa. Um texto sucinto mas profundo de Duval Pestana integra o espectador menos atento no universo do absurdo. Na ficha técnica falta a distribuição dos papéis pelas personagens. De qualquer forma, é um instrumento de trabalho que dá lições a grupos universitários que, apesar de terem como obrigação inerente ao seu estatuto a formação de públicos, muitas vezes nem constroem uma folha de sala com contributos para a leitura do espectáculo.
Movimentando-se no universo do Teatro do Absurdo com o à vontade que quem conhece profundamente os autores e os textos, Duval Pestana presta ano após ano um verdadeiro serviço público no que diz respeito à educação do público para o teatro. Lagos tem o privilégio de contar entre os seus pares com este notável encenador que trabalha por dentro, a partir dos jovens, a aprendizagem para a apreciação de um espectáculo teatral. É pois natural que vejamos cada vez mais o teatro reaparecer naquela cidade barlaventina, nas suas formas mais variadas, apoiando os grupos regionais, apreciando as propostas nacionais. Com uma infra-estrutura de excelência, com professores a trabalharem na educação de públicos, cabe à vontade política investir ao longo do ano na mais completa de todas as artes, suporte da educação de um povo: o teatro.
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