Trabalhar com crianças é das experiências mais difíceis que um actor pode ter. Implica uma grande sabedoria pedagógica, uma entrega ilimitada, magia e muita seriedade. Estes ingredientes, difíceis de serem encontrados em conjunto nas proporções adequadas, estavam bem definidos e geridos de forma exemplar no espectáculo A Lenda da Moura Cássima, que tem sido levada a cena pelo Teatro da Estrada um pouco por todo o concelho de Loulé.
O espectáculo começa com a estrada intempestiva de um cristão que irrompe pela plateia e se dispõe a matar os mouros todos. Esta personagem, interpretada por Adelaide Fonseca, tem o vigor e a desenvoltura necessária para ser ao mesmo tempo credível e divertida. A sonoplastia foi uma estrutura fundamental para este trabalho pois os músicos, criando em directo as sonoridades, acompanhavam a par e passo a trama do espectáculo, dialogando com os actores.
A reescrita da lenda da desventurada moura Cássima deu azo a um trabalho complexo de música, manipulação de bonecos, trabalho de actor e a uma séria reflexão pedagógica, se for explorada posteriormente pelos professores e educadores. A direcção de Déborah Benveniste mostrou-se cuidada, atenta aos pequenos pormenores. A cenografia está adequada a um trabalho para crianças, onde a par de um realismo bem ao agrado dos meninos, há espaço para a magia. A nora que puxa a água do poço roda nos momentos de encantamento. O singelo alguidar de barro transporta as crianças na viagem do carpinteiro das terras dos infiéis até à fonte de Loulé.
A lenda da moura Cássima é uma história sobre o desespero, a confiança, a traição, a desventura e a esperança. Nesta versão, o pai da moura teve de voltar à sua terra depois dos cristãos terem expulsado os mouros do Algarve. O mouro, detentor de artes mágicas, encanta as suas três filhas num poço para partir mais depressa, com a promessa de as desencantar num futuro próximo. Cássima, a mais rebelde, não quer o encantamento. Quer correr mundo, lutar ao lado do pai, tudo menos ficar encantada num poço. O pai, para a proteger não aceita e ela tem a mesma sorte das duas irmãs. Nas terras da moirama o pai mouro confia num pobre carpinteiro algarvio e propõe-lhe que este desencante as suas três filhas, mandando-o através de um alguidar mágico de volta ao Algarve, neste caso para Loulé. A prova de confiança foi traída não pelo carpinteiro, mas pela mulher deste, que curiosa foi vasculhar na bolsa dele e lá encontrou os três pães para o desencantamento. Abriu um e imediatamente viu escorrer sangue. Guardou-o à mesma na sacola do marido, deixando-o ir desencantar as mouras sem saber do sucedido. Os dois primeiros desencantamentos correram bem e quando chegou à moura Cássima, não a conseguiu tirar dali porque a mulher lhe tinha estragado o encantamento. Esta história cruel foi apresentada de tal forma que mesmo as partes mais violentas faziam sentido no contexto de realismo mágico da encenação. No final a moura abandonada espera por uma visita anual na noite de S. João, ao que o carpinteiro corresponde, deixando-lhe a esperança preenchida para mais um ano. Uma história que chama a atenção para o choque cultural, para a intolerância e para a não aceitação do diferente. Para a fraternidade e a confiança que pode existir mesmo entre pessoas de culturas diferentes.
Mas a grande revelação deste espectáculo foi a actriz Adelaide Fonseca. Dona de uma energia invejável, histriónica, expressiva, com uma grande capacidade de comunicação com as crianças. Com sentido de ritmo, entrava em sintonia com as sonoridades criadas por Sérgio Almeida e Rui Afonso, envolvendo as crianças. Também Deborah fazia da manipulação uma arte, fazendo-nos acreditar que Cassima tinha ganho vida própria e se tinha soltado do poço.
Assim é um prazer assistir-se um espectáculo honesto intelectualmente, construído a pensar nas crianças, que ensina a brincar e tem uma matriz pedagógica para explorar com os educadores. É de louvar o empenho que o Teatro da Estrada teve numa grande produção séria para crianças porque elas merecem esse cuidado.
O espectáculo começa com a estrada intempestiva de um cristão que irrompe pela plateia e se dispõe a matar os mouros todos. Esta personagem, interpretada por Adelaide Fonseca, tem o vigor e a desenvoltura necessária para ser ao mesmo tempo credível e divertida. A sonoplastia foi uma estrutura fundamental para este trabalho pois os músicos, criando em directo as sonoridades, acompanhavam a par e passo a trama do espectáculo, dialogando com os actores.
A reescrita da lenda da desventurada moura Cássima deu azo a um trabalho complexo de música, manipulação de bonecos, trabalho de actor e a uma séria reflexão pedagógica, se for explorada posteriormente pelos professores e educadores. A direcção de Déborah Benveniste mostrou-se cuidada, atenta aos pequenos pormenores. A cenografia está adequada a um trabalho para crianças, onde a par de um realismo bem ao agrado dos meninos, há espaço para a magia. A nora que puxa a água do poço roda nos momentos de encantamento. O singelo alguidar de barro transporta as crianças na viagem do carpinteiro das terras dos infiéis até à fonte de Loulé.
A lenda da moura Cássima é uma história sobre o desespero, a confiança, a traição, a desventura e a esperança. Nesta versão, o pai da moura teve de voltar à sua terra depois dos cristãos terem expulsado os mouros do Algarve. O mouro, detentor de artes mágicas, encanta as suas três filhas num poço para partir mais depressa, com a promessa de as desencantar num futuro próximo. Cássima, a mais rebelde, não quer o encantamento. Quer correr mundo, lutar ao lado do pai, tudo menos ficar encantada num poço. O pai, para a proteger não aceita e ela tem a mesma sorte das duas irmãs. Nas terras da moirama o pai mouro confia num pobre carpinteiro algarvio e propõe-lhe que este desencante as suas três filhas, mandando-o através de um alguidar mágico de volta ao Algarve, neste caso para Loulé. A prova de confiança foi traída não pelo carpinteiro, mas pela mulher deste, que curiosa foi vasculhar na bolsa dele e lá encontrou os três pães para o desencantamento. Abriu um e imediatamente viu escorrer sangue. Guardou-o à mesma na sacola do marido, deixando-o ir desencantar as mouras sem saber do sucedido. Os dois primeiros desencantamentos correram bem e quando chegou à moura Cássima, não a conseguiu tirar dali porque a mulher lhe tinha estragado o encantamento. Esta história cruel foi apresentada de tal forma que mesmo as partes mais violentas faziam sentido no contexto de realismo mágico da encenação. No final a moura abandonada espera por uma visita anual na noite de S. João, ao que o carpinteiro corresponde, deixando-lhe a esperança preenchida para mais um ano. Uma história que chama a atenção para o choque cultural, para a intolerância e para a não aceitação do diferente. Para a fraternidade e a confiança que pode existir mesmo entre pessoas de culturas diferentes.
Mas a grande revelação deste espectáculo foi a actriz Adelaide Fonseca. Dona de uma energia invejável, histriónica, expressiva, com uma grande capacidade de comunicação com as crianças. Com sentido de ritmo, entrava em sintonia com as sonoridades criadas por Sérgio Almeida e Rui Afonso, envolvendo as crianças. Também Deborah fazia da manipulação uma arte, fazendo-nos acreditar que Cassima tinha ganho vida própria e se tinha soltado do poço.
Assim é um prazer assistir-se um espectáculo honesto intelectualmente, construído a pensar nas crianças, que ensina a brincar e tem uma matriz pedagógica para explorar com os educadores. É de louvar o empenho que o Teatro da Estrada teve numa grande produção séria para crianças porque elas merecem esse cuidado.
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