Wednesday, August 15, 2007

Ideias do Levante - A Culpa de uma espera


A Associação Cultural de Lagoa estreou dias 25, 26 e 27 de Novembro o espectáculo À Espera, a partir de um texto jornalístico de Sónia Morais Santos e encenado por Bruno Batista. Pode dizer-se que, dada a experiência a Bruno Batista e o seu envolvimento nas artes cénicas, esperar-se-ia mais deste jovem encenador, mesmo atendendo ao facto desta ser a sua primeira encenação. No entanto, se o público estiver atento aos pormenores da encenação verá que nada foi deixado ao acaso. A entrada da personagem principal em cena, com as características obsessivas que devem acompanhar psicologicamente a sua caracterização, o jogo cromático em cena, o desenho de luz a intensificar os pensamentos mais sombrios, o nome do próprio jornalista que surge e altera a passividade da vida daquela mulher, à espera do fim do seu pesadelo. Mas se houve um cuidado nos pormenores de encenação, o que não funcionou no espectáculo? Seguramente a direcção de actores, o verdadeiro sustentáculo desta produção. É de louvar a coragem da abordagem de um texto desta natureza, que mexe inevitavelmente com os sentimentos de culpa mais obscuros dos filhos relativamente aos seus pais. Sobretudo quando se passaram bons momentos e houve uma relação saudável. Mas ninguém aguenta ver os seres que ama definharem e, na maior parte das vezes, inevitavelmente se anseia pelo fim, com todos os sentimentos de culpa que essa miríade de sentimentos acarreta. Foi a assunção da culpabilidade e as contradições de uma personagem complexa e fora do sentido das realidades que faltou a Elsa Condeço. Elsa, embora não estivesse Elsa Condeço, ainda não estava Maria Isabel. Faltava-lhe maturidade e o ar abandonado e sofrido que uma mulher largada pelo marido, com dois filhos por criar e com uma mãe a cargo sofrendo da doença de Alzheimer deverá aparentar. Não é pelo facto de Elsa Condeço ser uma jovem actriz de personalidade bem disposta que a deverá impedir de fazer o papel. O que lhe faltou foi a coragem de investir até ao fim a mergulhar a sério no mundo tumultuoso da doença mental. E isso, nem se sabe bem se se deve pedir aos actores profissionais, quanto mais aos não profissionais. De qualquer forma, uma outra caracterização, mais fora da normalidade teria talvez ajudado a situar o espectador no universo mental descompensado daquela mulher. Uma caracterização mais carregada teria certamente ajudado a entender melhor o despropósito do beijo ao jornalista mais jovem, porque aquilo que vimos foi uma mulher atraente a beijar um homem da sua idade, o que, à partida, não provoca qualquer tipo de estranheza. Mas o problema principal prende-se com o jovem repórter, interpretado por Guilherme Nunes, que, ainda muito inexperiente, não dá a fluidez e a naturalidade que o texto pede. E um “furo” jornalístico, como se diz no seu texto, criado posteriormente por Bruno Batista, não é com certeza a entrevista a uma desgraçada que tem a mãe com a doença de Alzheimer. A actriz que faz de mãe, neste caso Margarida Gonçalves, esteve bastante convincente no seu papel, aparentemente fácil, inquietando o público com os gritos que dava fora de cena. A música do grupo Danças Ocultas era agradável, se bem que, com demasiado bom gosto para uma mulher que se manifesta tão fora da realidade.
De facto este trabalho não deixa indiferente o público. Bruno Batista terá de insistir mais na direcção de actores e no mostrar da verdade que ainda não está conseguido. De qualquer forma, o jovem encenador está no bom caminho e espera-se que a linha da Associação Ideias do Levante se mantenha na senda da qualidade.

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