Miss Daisy é uma adaptação do texto de Alfred Uhry, passado em meados do século XX, de 1948 a 1973, em Atlanta, no sul dos Estados Unidos, Miss Daisy conta a história de uma judia rica e reformada, Daisy Werthan, e do seu forçado motorista, Hoke Coleburn. A tradução de António Barahona é bastante fiel ao original de Uhry. Considerada pela seguradora como um perigo para a via pública por ter confundido a marcha-atrás com a primeira, Miss Daisy vê-se proibida de conduzir pelo seu próprio filho, Boolie Werthan, interpretado por Guilherme Filipe. Boolie contrata então um motorista negro, interpretado por Thiago Justino, para suprir as suas necessidades de deslocação. Miss Daisy, como mulher orgulhosa que sempre venceu os obstáculos da vida sozinha, recusa-se a mantê-lo como seu funcionário mas vê-se obrigada a conviver com Hoke, uma vez que o motorista está às ordens do seu filho. O motorista, mostrando uma sensibilidade inusitada perante um comportamento um pouco desadequado, vai conquistando a capacidade de aceitação de Miss Daisy perante si próprio. Ao longo do texto as relações humanas são a essência do argumento. Miss Daisy e Hoke aprendem a partilhar um mundo que está em convulsão e se quer mais justo. Deparamo-nos com o apontamento do discurso em que Marther Luther King é assassinado e com um ataque terrorista à Sinagoga. Miss Daisy toma consciência de que ela e o seu motorista são apenas dois seres à deriva num mundo em mudança.
A encenação naturalista de Celso Cleto aposta na imagem forte do carro da discórdia e numa cenografia depurada do interior da casa de Miss Daisy e do seu filho Boolie. A relação entre filho e mãe, ainda bastante uterina impede Miss Daisy de sentir qualquer simpatia e afecto pela sua nora. Guilherme Filipe desempenha adequadamente o papel de um filho dedicado e preocupado. Thiago Justino explora a figura de serviçal pouco instruído mas honrado. A sua dicção dificulta por vezes a compreensão do texto. Por outro lado, a sua corporalidade exagerada suja a personalidade de um homem íntegro que, pela sua simplicidade e pureza, conquista a amizade de uma velha avarenta judia. A cena em que Miss Daisy oferece ao seu motorista um livro para ele treinar a caligrafia, cheia de pausas e olhares significativos, é comovedora por toda a contenção que nela se adivinha. Muito diferente das outras em que se procura o riso fácil, obrigando Thiago Justino a entrar e a sair de cena desajeitadamente.
Eunice Muñoz tem uma interpretação de excelência neste espectáculo que foi concebido a pensar na sua prestação. Eunice tem-nos habituado a uma interpretação única ao longo da sua vasta carreira. Zerlina para os mais atentos e Dona Branca para o público em geral são apenas dois apontamentos de excelência num oceano de interpretações memoráveis. Neste trabalho é emocionante a mudança de Eunice Muñoz durante o envelhecimento, de cerca de 25 anos, que medeia a primeira e a segunda parte do espectáculo. A decrepitude evidente no olhar quando, internada num lar de idosos, confessa que Hoke é o seu melhor amigo. Uma decrepitude misturada com uma grande argúcia, patente no gesto com que protege a sua jóia, mal é mencionado o nome da sua nora.
Este espectáculo vale pela interpretação de Eunice Muñoz e pela adaptação cenográfica do automóvel que foi construído segundo o desenho de Costa Reis Guliver. O sistema mecânico que permite a rotação do corpo médio do automóvel permite uma visualização simbólica da condução do motorista muito bem conseguida.
Do espectáculo fica a mensagem universal do respeito pelo outro e das pequenas mudanças que vão sendo feitas ao nível da micro sociologia, no quotidiano.
Relativamente à educação do público há algum trabalho a fazer, pois no Teatro das Figuras observou-se um certo regresso ao aplauso que se fazia em tempos ancestrais das vedetas, mal saíam de cena. Um acto, em teatro, deve ter o sentido de ritmo que não se compadece com aplausos de cada vez que há uma mudança de luz. Por isso o serviço educativo está agora a investir em recursos humanos, na educação de públicos para que amanhã, esse público saiba apreciar convenientemente um espectáculo de teatro.
A encenação naturalista de Celso Cleto aposta na imagem forte do carro da discórdia e numa cenografia depurada do interior da casa de Miss Daisy e do seu filho Boolie. A relação entre filho e mãe, ainda bastante uterina impede Miss Daisy de sentir qualquer simpatia e afecto pela sua nora. Guilherme Filipe desempenha adequadamente o papel de um filho dedicado e preocupado. Thiago Justino explora a figura de serviçal pouco instruído mas honrado. A sua dicção dificulta por vezes a compreensão do texto. Por outro lado, a sua corporalidade exagerada suja a personalidade de um homem íntegro que, pela sua simplicidade e pureza, conquista a amizade de uma velha avarenta judia. A cena em que Miss Daisy oferece ao seu motorista um livro para ele treinar a caligrafia, cheia de pausas e olhares significativos, é comovedora por toda a contenção que nela se adivinha. Muito diferente das outras em que se procura o riso fácil, obrigando Thiago Justino a entrar e a sair de cena desajeitadamente.
Eunice Muñoz tem uma interpretação de excelência neste espectáculo que foi concebido a pensar na sua prestação. Eunice tem-nos habituado a uma interpretação única ao longo da sua vasta carreira. Zerlina para os mais atentos e Dona Branca para o público em geral são apenas dois apontamentos de excelência num oceano de interpretações memoráveis. Neste trabalho é emocionante a mudança de Eunice Muñoz durante o envelhecimento, de cerca de 25 anos, que medeia a primeira e a segunda parte do espectáculo. A decrepitude evidente no olhar quando, internada num lar de idosos, confessa que Hoke é o seu melhor amigo. Uma decrepitude misturada com uma grande argúcia, patente no gesto com que protege a sua jóia, mal é mencionado o nome da sua nora.
Este espectáculo vale pela interpretação de Eunice Muñoz e pela adaptação cenográfica do automóvel que foi construído segundo o desenho de Costa Reis Guliver. O sistema mecânico que permite a rotação do corpo médio do automóvel permite uma visualização simbólica da condução do motorista muito bem conseguida.
Do espectáculo fica a mensagem universal do respeito pelo outro e das pequenas mudanças que vão sendo feitas ao nível da micro sociologia, no quotidiano.
Relativamente à educação do público há algum trabalho a fazer, pois no Teatro das Figuras observou-se um certo regresso ao aplauso que se fazia em tempos ancestrais das vedetas, mal saíam de cena. Um acto, em teatro, deve ter o sentido de ritmo que não se compadece com aplausos de cada vez que há uma mudança de luz. Por isso o serviço educativo está agora a investir em recursos humanos, na educação de públicos para que amanhã, esse público saiba apreciar convenientemente um espectáculo de teatro.
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