Quatro mulheres de coragem é a tradução de António Henrique Conde do texto Bold Girls, premiado com o Most Promising Playwrigth Award pela comissão de críticos de teatro de Londres. Levar à cena este texto foi um desafio de coragem que Figueira Cid propôs encenar a quatro actrizes: Ana Leitão, Josefina Massango, Marta Inocentes e Sara Costa, esta última aluna do mestrado de teatro da Universidade de Évora. Quatro actrizes que conseguiram dar, ao longo de duas horas, a sensação de que todos estávamos debaixo do fogo cruzado de Belfast. Quatro mulheres a quem levaram os homens. Mortos ou presos, eles são a ausência que elas têm de ultrapassar num mundo povoado pelo medo. Em Quatro Mulheres de Coragem O universo feminino permanece intocável malgrado os autocarros a arder, os tiros a rondar a casa, os bloqueios da estrada. O pão continua a entrar em casa e as crianças continuam a espalhar os brinquedos pela sala. A generosidade intrínseca não permite que se negue uma chávena de chá às amigas nem um pouco do calor da lareira a uma desconhecida, fugida das balas que, ensanguentada, pede guarida.
Este texto fala da vida. De uma vida difícil que as mulheres furam e decidem tornar mais leve. E rir. Riem das suas misérias, dos seus medos, das cenas trágicas e brutais por que passaram. Os tiros ouvem-se ao longe e ao perto, o medo é constante. No entanto, estas mulheres conseguem fantasiar com uma noite diferente. Conseguem pôr um vestido bonito para dançar, conseguem sonhar com uma vida diferente olhando para o verniz espelhado nas unhas. A história põem em confronto mulheres que descobrem segredos inenarráveis e que, mesmo assim, ultrapassam o ódio e continuam a amparar-se.
A caracterização das personagens está rigorosa e real. Elas são quatro mulheres irlandesas, que se vestem como mulheres irlandesas católicas, que se preocupam com a maledicência alheia, contribuindo para ela.
O espectáculo Quatro Mulheres de Coragem conduz o espectador a uma vertigem de violência interior absorvente. No texto debatemo-nos com duas viúvas, uma órfã e a mulher de um prisioneiro político. As amigas traem-se, mãe e filha acusam-se mutuamente, a órfã vem destabilizar a rotina quotidiana. No final a órfã encontra uma nova mãe, a viúva uma nova consciência, a mulher do prisioneiro uma nova vida e a mãe uma nova paz.
A cenografia, realista, recria o interior de uma casa modesta de Belfast e o interior de uma discoteca onde se sorteiam electrodomésticos. Na casa se prepara o chá, se lava e engoma ainda roupa de homens que morreram, se estende numa longa corda improvisada as vestes de viúva, pressagiando a saída para a noite. A madrugada traz consigo os seus despojos e o estendal é transformado noutro mais pequeno, com vista para a rua, anunciando uma mudança. A mudança de perspectiva do olhar, simbolizada pela roupa ocultando a vista que se tem da janela, abarca todos os intervenientes na história. A rapariga que olhava a vida da casa a partir do seu exterior passa a fazer parte integrante dela. A mãe de Cassey descobre que a filha sempre apoiou o pai, mesmo quando a encontrava a sangrar depois de uma sova. Marie retira finalmente a fotografia do marido, assassinado por motivos políticos, e exprime toda a sua raiva na imagem do homem intocável que criou. Confronta-se com a mentira, vivida ao longo de anos, e muda o seu código de valores. Cassey assume-se perante a mãe, revela-se perante a amiga e parte à procura de outra terra, longe da miséria moral que a envolve.
O desenho de luz de Henrique Martins e Figueira Cid é rigoroso, colorindo e ocultando as cenas na justa medida da sua intensidade dramática.
O equilíbrio entre as quatro actrizes é uma marca deste trabalho e a emoção prende o espectador do primeiro ao último momento. Desde a conversa banal do quotidiano feminino até ao momento da rusga no nigth-club da terra, estas quatro actrizes são genuínas e conseguem passar as diferentes emoções. Foi tocante ver estas quatro mulheres chorarem, rirem, acocorarem-se com o medo, gritarem de raiva. Um desempenho de excelência. Uma encenação de coragem. Um prazer para o espectador.
Este texto fala da vida. De uma vida difícil que as mulheres furam e decidem tornar mais leve. E rir. Riem das suas misérias, dos seus medos, das cenas trágicas e brutais por que passaram. Os tiros ouvem-se ao longe e ao perto, o medo é constante. No entanto, estas mulheres conseguem fantasiar com uma noite diferente. Conseguem pôr um vestido bonito para dançar, conseguem sonhar com uma vida diferente olhando para o verniz espelhado nas unhas. A história põem em confronto mulheres que descobrem segredos inenarráveis e que, mesmo assim, ultrapassam o ódio e continuam a amparar-se.
A caracterização das personagens está rigorosa e real. Elas são quatro mulheres irlandesas, que se vestem como mulheres irlandesas católicas, que se preocupam com a maledicência alheia, contribuindo para ela.
O espectáculo Quatro Mulheres de Coragem conduz o espectador a uma vertigem de violência interior absorvente. No texto debatemo-nos com duas viúvas, uma órfã e a mulher de um prisioneiro político. As amigas traem-se, mãe e filha acusam-se mutuamente, a órfã vem destabilizar a rotina quotidiana. No final a órfã encontra uma nova mãe, a viúva uma nova consciência, a mulher do prisioneiro uma nova vida e a mãe uma nova paz.
A cenografia, realista, recria o interior de uma casa modesta de Belfast e o interior de uma discoteca onde se sorteiam electrodomésticos. Na casa se prepara o chá, se lava e engoma ainda roupa de homens que morreram, se estende numa longa corda improvisada as vestes de viúva, pressagiando a saída para a noite. A madrugada traz consigo os seus despojos e o estendal é transformado noutro mais pequeno, com vista para a rua, anunciando uma mudança. A mudança de perspectiva do olhar, simbolizada pela roupa ocultando a vista que se tem da janela, abarca todos os intervenientes na história. A rapariga que olhava a vida da casa a partir do seu exterior passa a fazer parte integrante dela. A mãe de Cassey descobre que a filha sempre apoiou o pai, mesmo quando a encontrava a sangrar depois de uma sova. Marie retira finalmente a fotografia do marido, assassinado por motivos políticos, e exprime toda a sua raiva na imagem do homem intocável que criou. Confronta-se com a mentira, vivida ao longo de anos, e muda o seu código de valores. Cassey assume-se perante a mãe, revela-se perante a amiga e parte à procura de outra terra, longe da miséria moral que a envolve.
O desenho de luz de Henrique Martins e Figueira Cid é rigoroso, colorindo e ocultando as cenas na justa medida da sua intensidade dramática.
O equilíbrio entre as quatro actrizes é uma marca deste trabalho e a emoção prende o espectador do primeiro ao último momento. Desde a conversa banal do quotidiano feminino até ao momento da rusga no nigth-club da terra, estas quatro actrizes são genuínas e conseguem passar as diferentes emoções. Foi tocante ver estas quatro mulheres chorarem, rirem, acocorarem-se com o medo, gritarem de raiva. Um desempenho de excelência. Uma encenação de coragem. Um prazer para o espectador.
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